COMO A LGPD IRÁ CRIAR NOVAS DEMANDAS PROFISSIONAIS

Exigências da nova Lei Geral de Proteção de Dados e dos próprios consumidores demandam uma presença cada vez maior de profissionais capacitados sobre o tema

15.10.2019 | Por Paulo de Tarso Andrade Bastos Filho

As empresas estão ganhando dinheiro usando os dados pessoais de toda população. Parece óbvio, certo? Há menos de um ano de vigência da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, a ficha caiu. E é justo pausar para considerar como é fundamental para quase todas as empresas que atuam na presente realidade, em um mundo cada vez mais digital, a busca incessante pelo tratamento e a utilização de trilhões de bytes em dados online para transformá-los em lucro.

Contudo, da mesma forma que empresas de todos os tamanhos e atividades buscam explorar financeiramente os dados pessoais, a maioria delas ainda age com resistência à inexorável aplicação de parâmetros para defesa da privacidade dos titulares dos dados. Em vez disso, insistem em agir como se os dados estivessem à disposição para serem utilizados livremente de acordo com seus interesses comerciais, corporativos e negociais.

As empresas usam os dados online – sejam decorrentes de posts, avaliações de produtos, número de acessos a sites, volume de likes que certos influenciadores digitais ou toda a demais gama de informações disponíveis – na expectativa de atingir o propagado Kaizen. Desta forma, assim como as corporações buscam utilizar o que se percebe como valorosos bens para atingir os objetivos de seus acionistas, deveriam também estar atentas aos reflexos inevitáveis da proteção de dados, notadamente os aspectos positivos para a empresa e à sociedade como um todo.

Vantagem competitiva

Assim como a reputação digital é considerada como capital corporativo, motor e estímulo maior para que, antes da vigência da LGPD, as empresas invistam na adequação aos princípios básicos de proteção dos dados, é crucial ressaltar que a incorporação de políticas de governança para proteção de dados deve ser vista não só como vantagem competitiva para empresas, mas como verdadeira mudança de paradigma para todo o ambiente empresarial.

Além disso, poucos observam que, no mundo digital, além da percepção pública sobre o respeito à privacidade dos cidadãos, a implementação de um programa de proteção de dados trará importantes repercussões para todos os stakeholders.

Nesse sentido, é importante reconhecer a capacidade disruptiva da aplicação e implementação da proteção de dados pessoais, pois implicará na transformação em como o tratamento de dados é percebido pela sociedade. E um dos aspectos que deveria ser festejado é a repercussão junto ao mercado de trabalho.

Mesmo agora, enquanto a maioria dos empresários ainda aguarda e planeja o melhor momento para buscar se adaptar aos novos critérios de privacidade e proteção de dados, já se percebe grande movimento decorrente dessa nova realidade. E aqui não nos referimos apenas a consultores, advogados, técnicos em tecnologia da informação ou especialistas em compliance, mas de toda gama de profissionais e prestadores de serviços.

Novas demandas do mercado

Essa realidade é facilmente perceptível, bastando observar a quantidade de eventos, cursos, seminários e congressos disputados em que se discute a proteção de dados em todas suas esferas e para diferentes áreas de atuação. O volume de discussões sobre o tema e o grande afluxo de interessados decorrem justamente da percepção de que o respeito à privacidade e o tratamento de dados pessoais seguindo aqueles parâmetros fixados pelas legislações brasileira e global marcarão a atuação corporativa nos próximos anos.

Isso porque, para que a proteção dos dados pessoais ocorra de forma eficaz, todos os profissionais envolvidos no tratamento dos dados deverão ser suficientemente treinados. Novos trabalhadores também terão que ser incorporados ao negócio, pois a LGPD incorpora elementos ao tratamento de dados – como prontidão para responder às demandas por informações, a inversão do ônus da prova e a implementação de um sistema de segurança das informações sob responsabilidade das empresas – que implicarão em acréscimo significativo na ativação de profissionais atuando em tal área.

Como o mercado está inserido numa realidade digital bastante dinâmica, não bastará às empresas apenas oferecer treinamentos esporádicos aos seus colaboradores, até pelos riscos de ataques cibernéticos cada vez maiores. É fundamental a atuação conjunta de todas as áreas, inclusive algumas ainda não adaptadas a tais demandas. Essa necessidade permitirá a criação de novos postos de trabalho e de oportunidades para prestadores de serviços.

Em tempo real

Quando a agência responsável pela fiscalização do tratamento de dados, a ANPD, tiver orçamento próprio, será implementado um sistema para troca de informações e prestação de esclarecimentos em tempo real. Isso quer dizer que as empresas deveriam já estar em fase de desenvolvimento de um sistema de governança para segurança da informação.

Considerando que a expectativa mundial sobre o futuro do trabalho é cada vez mais preocupante, já que a automação de várias atividades antes desempenhadas por pessoas é uma realidade que se impõe, seria saudável que as corporações, percebendo essa nova realidade trazida pela proteção dos dados, concentrassem esforços para treinamento e contratação de trabalhadores para lidar com as demandas, que são cada vez maiores e decorrentes da plena observância dos preceitos da privacidade das pessoas. Essa atitude, por sua vez, traria efeitos positivos sobre o mercado de trabalho.

A transparência é hoje uma exigência do consumidor, que, cada vez mais, cobra e fiscaliza padrões éticos antes de escolher qual produto ou serviço irá adquirir. A empresa que garantir o cumprimento dos preceitos da LGPD estará criando não somente novos postos de trabalho, mas fortalecendo seu compromisso com a sociedade.

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